1 de março de 2010

A leitura do objecto de estudo com base na sociologia de Georg Simmel


Edipe et le Sphinx, Jean-August Dominique Ingres (1827)

Edipus and the Sphinx after Ingres,
Francis Bacon (1983)



Georg Simmel (1858 – 1918) nasceu em Berlim no século XIX. Seu pai era um homem de negócios.
Enquanto estudante da Universidade de Berlim estudou, Filosofia, História, Psicologia e Italiano.
Teve um contributo pioneiro para a história da sociologia moderna. Fundou com Max Weber a Sociedade Sociológica Alemã em 1910.
Criou e desenvolveu a sociologia da forma influenciado pela filosofia de Kant.
Para Simmel, a concepção de que a sociedade era apenas uma colecção de indivíduos isolados, não fazia sentido. Para ele, a realidade das sociedades era composta por inúmeros acontecimentos, acções e interacções.
A sociedade não abrange apenas as interacções mais duradouras como o Estado, família e igreja. A sociedade significa que os indivíduos estão sempre relacionados uns com os outros, influenciando e sendo influenciados. Esta acção reproduz-se reciprocamente por determinados instintos ou para determinados fins.

Debruçando-nos no capítulo da Interacção Social no livro de George Ritzer (1996) Sociological Theory e em especial na Geometria Social (p.164, 165), encontramos um paralelo importante com o nosso objecto de estudo – A díade e a tríade.
Na Sociologia Formal, Simmel desenvolve uma “geometria” social das relações, em especial, os números e a distância.
Os números interessaram a Simmel enquanto impacto na qualidade das suas interacções e tem visibilidade na sua exposição dos conceitos de díade (grupo de duas pessoas) e tríade (grupo de três pessoas).
Na díade não existe uma estrutura de grupo independente, cada membro tem um alto nível de individualidade (por exemplo: a relação; mãe, filho). Mas a tríade tem a faculdade de obter um significado que vai para além dos indivíduos envolvidos. Existe uma maior ameaça para a individualidade dos membros.
Com a introdução de um terceiro elemento no grupo, aparece a possibilidade de um novo número de papéis sociais. Por exemplo. O terceiro elemento pode ter um papel de árbitro numa resolução de problemas do grupo. Pode tornar-se num objecto de competição dos outros membros do grupo. Ou, intencionalmente, forçar um conflito entre os outros dois indivíduos com o objectivo de ganhar superioridade sobre eles. Pode surgir um sistema de estratificação de onde emerge uma estrutura de autoridade.
O movimento da díade para a tríade é essencial para o desenvolvimento de estruturas sociais, que se podem separar e dominar indivíduos. Essa possibilidade não existe na díade.
As sociedades emergem, portanto, na transição da díade para a tríade e continuam a crescer para grupos maiores. Nestas grandes estruturas sociais, o indivíduo, está cada vez mais separado da sua estrutura social, crescendo mais sozinho, isolado e segmentado.
A contradição, é a sociedade permitir um aparecimento do individual e da autonomia, mas ao mesmo tempo impedir esse acontecimento por ser uma massa social.
Existe na teoria de Simmel uma atitude ambivalente no impacto da dimensão do grupo. Por um lado, o crescimento do grupo dá mais liberdade individual. Um grupo pequeno controla o indivíduo por completo. Contudo, numa grande sociedade o indivíduo tem tendência a envolver-se em pequenos grupos. Com por exemplo; as famílias.

Deste paradigma, interessa-nos em particular - A tríade - visto que, a tragédia do Édipo Rei, escrita por Sófocles no século V a.C. emerge de uma tríade familiar (Pai, Mãe e filho). E a tragédia do fatídico destino que o oráculo houvera preconizado, Édipo acaba por matar o seu pai e casar com a mãe.
Usaremos as palavras de José Ramos Coelho (2005) para um breve enquadramento da tragédia grega Édipo Rei:
“Édipo nasceu em um lar amaldiçoado. (…)
Laio sabia que não podia gerar um filho, pois se o fizesse, este iria matá-lo. É por esse motivo que, tão logo nasce a criança do ventre de Jocasta, é enjeitada, tem os pés amarrados (ou, noutra versão, perfurados e atados com uma correia), donde resultou uma inchação e um ferimento indelével que a marcará para sempre. Ela é entregue a um servo para que a abandone à própria sorte. (…)
O servo, porém, apieda-se com a triste sorte da criança, entregando-a a um pastor de Corinto, o qual a leva para os seus reis, Pólibo e Mérope, que, não tendo filhos, a adoptam como se ela tivesse sido por eles gerada. Por ter os pés inchados, ele é chamado de Édipo (Oidípous, de oidi = inchado + pous = pés). Sua renomeação é tanto ocultadora de sua origem (pois recebe outra nomeação) quanto reveladora (por aludir às feridas que adquiriu ao nascer, inscrição no corpo da rejeição parental).” (Coelho, 2005, p. 53)

Outra preocupação da geometria social de Simmel era a distancia. Na Philosophy of Money, ele enuncia alguns princípios acerca do valor – e do que faz as coisas valiosas – base para a análise do dinheiro. O ponto essencial desta teoria é que o valor das coisas está determinado pela distância do autor. Nada é valioso se estiver demasiado perto ou, se for demasiado fácil de obter ou, muito distante e muito difícil de adquirir.
Os objectos que são atingíveis, mas só com grande esforço, são os mais valiosos.
A distância tem também um papel fundamental no livro, The Stranger, um ensaio sobre um tipo de autor que não pode estar nem demasiado perto nem demasiado longe. Se estiver demasiado perto já não é um estranho. Se estiver demasiado longe, já não terá qualquer contacto com o grupo.

Este fenómeno é visível no campo das Artes Plásticas e no valor que as obras atingem no mercado da arte. Assim como, o nosso conhecimento sobre a História da Arte. Podemos aqui verificar que a pintura de Ingres estando já tão longe do seu autor tem um valor incalculável. Mas a obra de Bacon é mais atingível?
Não podemos também reconhecer um estilo ou um pintor se não conhecermos a que época pertence. Mas se esse pintor estiver ainda em desenvolvimento e não fizer parte da sociedade artística também não temos ferramentas para o reconhecer dentro de uma tendência.

Pelo ponto de vista de Simmel em relação às suas análises sobre o fenómeno da arte, ele só se interessa pela obra singular enquanto reveladora do artista.
Ingres acreditava que a “força interior” da personagem poderia ser expressa por um único traço no contorno. Por isso preferia desenhar as figuras de perfil usando uma sinuosa linha contínua, é exemplo dessa expressão a figura de Édipo na pintura Édipo e a Esfinge.
No quadro Édipo e a Esfinge depois de Ingres, Bacon altera a ordem das figuras tornando o centro do quadro a questão dos pés feridos/inchados, que estão na origem do nome de Édipo. Assim como Édipo foi rejeitado pelo seu pai, “deixando marcas profundas na alma do filho indefeso.” (Coelho, 2005, p. 53) Também Bacon foi repudiado por seu pai e obrigado a sair de casa quando este o encontrou a experimentar as roupas da mãe em frente ao espelho.


Mais alguma informação sobre George Simmel aqui, aqui e também aqui.

Sem comentários: